Sentou-se frente a ele numa sala tão vazia quanto os olhos que encarou. Eram poucas as faixas de luz que entravam pela janela e muitas as partículas de um pó que se fazia notar pelo ar. Respiravam um pseudo oxigénio quente carregado de uma tristeza que sufocava. Quebrou o silêncio com o que parecia ser um sussurro.
- Nunca pensei vê-lo chorar.
- Toda a alma tem lágrimas.
- Nunca imaginei ouvi-lo falar em almas.
- Não há quem não as tenha.
Deixa-me chorar. – implorou desviando o olhar.
- Deixe-me contá-las.
- O infinito não se conta.
- Então e as vezes em que dizia que também se conta o que não tem fim?
- Vejo que aprendeste bem a lição.
- Vejo que afinal me mentiu.
- Não menti. Eram números.
- Como pode haver tanta emoção por detrás deles?
- Quem te mandou olhar além deles? Vai embora, deixa-me chorar.
- Porque se esconde professor?
(Suspirou. Deixou os braços cair no colo e encostou-se para trás)
- Por já me ter mostrado demais.
- Partiram-lhe o coração?
- A alma, porra!
- Como sabe?
- Contei-lhe os pedaços.
- E depois?
- Vais continuar a fazer perguntas?
- Se puder...até entender como alguém aparentemente tão implacável pode chorar assim. Como se lhe saísse de cada um desses pedaços.
(Encarou-o num breve silêncio)
- Depois vieram os números e tornem-me aparentemente implacável.
- Se eu chorasse assim tinha-me tornado escritor.
- Não vejas tudo pela lógica. Os números também trazem poesia.
- Mas não rimam. Nem, tão pouco, todos a conseguem ver.
- Quis-me esconder. Para mim, estava ótimo assim.
- Não se arrepende?
- Da matemática? Nem um minuto.
- Mas afinal o que de melhor ela lhe trouxe?
- A matemática? A aprender a contar o infinito.